Uma pesquisa realizada pela Fiocruz da Bahia, em parceria com a Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, mapeou os riscos de internações psiquiátricas entre crianças e jovens de baixa renda no Brasil. O estudo apontou a violência cotidiana, na periferia das grandes cidades, como um dos principais fatores de distúrbios emocionais, que podem levar a internações.
Mikaella ou por um período de grave sofrimento psíquico e, várias vezes, tentou tirar a própria vida. Ela só tinha 16 anos quando foi acolhida no Centro de Atenção Psicossocial Infanto-juvenil (Capsi) Maurício de Sousa. Ali, ela enfrentou diversas noites internada durante o período de crise.
"Eu realmente me sentia muito sozinha. Até porque demorei muito pra contar sobre os meus problemas pros familiares. Foi uma sensação muito difícil, muito diferente. Eu me sentia sozinha, e, com eles, me senti diferente. Parece que eles são minha nova família. Eles sempre procuravam saber como eu estava. Mesmo eu estando mal, eles estavam ali do meu lado, me apoiando praticamente todas as vezes”, conta Mikaella
A incompreensão e a violência que Mikaella sofreu de outras pessoas durante a crise foram o que fizeram a mãe dela, Leila Santos, buscar atendimento especializado.
"Foram muitas tentativas ruins. Eu não sabia como lidar, e aqui as pessoas conseguiram fazer com que eu aprendesse a lidar com a doença dela. Hoje, eu não digo que ela é mais doente. Hoje, ela é uma pessoa maravilhosa que está crescendo e evoluindo. E eu não tenho nem palavras para expressar todo o meu sentimento”, diz Leila.
A reforma psiquiátrica transformou as formas de tratamento para transtornos mentais e tornou a internação uma medida excepcional e temporária em momentos de crise.
"Hoje, no município do Rio, a gente não tem mais a internação psiquiátrica de crianças e adolescentes. Hoje a gente trabalha com os acolhimentos no Capsis, que é quando a criança ou o adolescente necessita de uma intensividade no cuidado e precise ficar mais tempo no serviço, sem desvinculá-lo do seu território, dos seus laços familiares, ou do que ele vem promovendo e produzindo na escola e na família. A gente continua esse trabalho, esse acompanhamento, para que ele retorne para as suas atividades de uma forma mais organizada”, destaca Alice Peçanha, assessoria técnica de saúde mental.
A exposição a algum tipo de violência está por trás da maioria dos casos que envolvem a internação psiquiátrica de pessoas entre 5 e 24 anos de idade.
"É importante não só acolher no momento da violência, no ato em que aconteceu o ataque, mas também acompanhar as crianças e jovens ao longo da vida. No caso, se for de ter um diagnóstico precoce, também é importante o tratamento precoce e a atenção às questões psiquiátricas”, afirma Lidiane Toledo, pesquisadora associada CIDACS/Fiocruz-BA
Nas conclusões, o estudo destaca a importância de políticas públicas de prevenção da violência e de redução das desigualdades econômicas para a promoção da saúde mental. Intervenções que rompem com o círculo da pobreza, como programas de transferência de renda, ajudam a diminuir o número de internações psiquiátricas.
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